quarta-feira, 7 de setembro de 2016

A igreja e a deficiência física

“Nos deram espelhos e vimos um mundo doente. Tentei chorar e não consegui”.

Os versos acima fazem parte da música Índios da banda de pop rock brasileiro Legião Urbana. Surpreendentemente o verso mostra uma realidade bíblica acerca da depravação do homem. Vivemos em um mundo que constantemente temos que viver com dores e doenças que nos lembram diuturnamente as mazelas trazidas pelo pecado original. Hoje, 07 de setembro de 2016, terá início as Paraolimpíadas do Rio de Janeiro e gostaria de fazer algumas reflexões sobre o porquê de não nos empolgarmos com a paraolimpíada como nos empolgamos com as olimpíadas.

Um olhar indiferente sobre a dor alheia
Não temos por costume nos preocupar com a dor alheia a não ser que essa dor seja escancarada diante de nós de forma continuada. Vemos homens andrajosos nas ruas, viciados e deficientes e não levamos em consideração a dor que esses indivíduos passam em serem tratados com indiferença pela maioria das pessoas. Basta olhar as campanhas publicitárias das maiores empresas do país e até podemos considerar certa diversidade ao tentar mostrar pessoas de diferentes cores, mas quase nunca vemos pessoas com deficiências físicas fazendo o papel protagonistas dessas campanhas. As novelas, gênero artístico preferido de uma parcela significativa dos brasileiros, também não contam com pessoas que são “especiais”. Geralmente esses são pessoas que gozam de perfeita saúde, tem uma excelente aparência e são “mais vendáveis”, do ponto de vista comercial do produto oferecido por esses segmentos. Nada de pessoas em cadeiras de rodas, cegas ou amputadas nesse segmento. Esses só aparecem na mídia para promover eventos como os jogos paraolímpicos como o que ocorre esse ano em nosso país.


No segmento esportivo acontece o mesmo. Confesso que quando penso em esportes de alto rendimento eu penso em Usain Bolt quebrando todos os recordes imagináveis do atletismo, Michael Phelps aumentando o número de suas medalhas e uma infinidade de pessoas com corpos perfeitos, no melhor momento físico de suas vidas conquistando metas impensáveis para pessoas comuns. Pensar em pessoas com níveis altos de paralisia, cegos e cadeirantes buscando suas marcas não parece algo muito empolgante a primeiro momento para a maioria das pessoas. O fato é que nós estamos cotidianamente sendo lembrados de que o pecado nos afetou grandemente. Eventos raros como esses nos fazem ter esse entendimento. As amputações desses atletas, suas marcas em escala menor de alcance pessoal, suas deficiências nos lembram dessa verdade bíblica e nos fazem considerar que também somos afetados pelo mesmo mal, ainda que não seja algo perceptível externamente.

Os deficientes nas Escrituras
Na Bíblia somos informados primeiramente que alguns personagens secundários eram também deficientes. No Antigo Testamento somos lembrados de Mefibosete, filho de Jonas, amigo de Davi, que aos cinco anos de idade, ao saber da morte de Saul seu avô, a ama que cuidava dele apressou-se em fugir com ele nos braços e o derrubou no chão e Mefibosete ficou manco para o resto da vida (2 Samuel 4.4). Davi o tratou com dignidade e o fez sentar-se em lugar de honra até a sua morte. No Novo Testamento são inúmeros os exemplos. Talvez o mais famoso seja o caso de Bartimeu que era cego e foi curado pelo Senhor Jesus (Mc 10.46-52). Exemplos como esses nos relatam que nos tempos bíblicos a deficiência também era vista em sua complexidade e retratada de forma real e atenciosa. Jesus em Seu ministério terreno deu ênfase especial sobre os deficientes, pois lemos a Seu respeito:

“... e vieram a ele muitas multidões trazendo consigo coxos, aleijados, cegos, mudos e outros muitos e os largaram junto aos pés de Jesus; e ele os curou”. (Mateus 15.30)

Havia uma preocupação natural do Senhor em assistir pessoas afetadas pela queda. Endemoniados e pessoas com todo tipo de adversidades causadas explicitamente pela queda eram curadas por Jesus em Seu ministério terreno. Isso mostra como, para o Senhor, restaurar o homem, em sua integralidade, era uma de Suas maiores preocupações.

O olhar da igreja para as deficiências humanas
Talvez estejamos mais afetados pela queda do que percebemos. Talvez não tenhamos problemas físicos aparentes e isso nos faz olhar para esses problemas como se eles não fossem tão graves assim, pois são problemas de outras pessoas e não os nossos. A igreja de Cristo não deveria ser indiferente quanto a tudo isso, pois deveríamos estar familiarizados com todas as dificuldades que a queda nos legou. Ao nos depararmos com pessoas deficientes deveríamos nos perguntar “por que razão não temos um ministério que tente incluir essas pessoas de maneira redentiva em nossas comunidades?”. Sei que existem igrejas que buscam introduzir em seus cultos a linguagem de libras para tornar a mensagem acessível aos surdos e mudos, que existem igrejas exclusivas para esse tipo de público, mas todos os nossos esforços ainda são pequenos em nosso alcance, pois o “mundo doente” em que vivemos tem variedades de inaptidões de todos os tipos. Talvez, ao considerar o que podemos fazer, pouco pode ser feito quando comparamos nossas condições com a obra completa de Cristo para com os deficientes, pois somente Ele tem condições de restaurar a saúde física e espiritual de todos os homens, inclusive de nós mesmos, mas as igrejas cristãs devem se preocupar em também alcançar essa classe de pessoas de maneira que elas se sintam incluídas em nossas comunidades.

Sugestões para a igreja incluir os deficientes
Devemos nos preocupar no alcance dos deficientes. Segue abaixo algumas sugestões para fazer isso:

- Desenvolvermos ministérios que contemplem incluir os deficientes de maneira ampla na igreja;
- Trabalhar um conceito de tolerância na igreja, através de exposições que mostrem o efeito da queda no estabelecimento de deficiências que podem ser melhor compreendidas de uma perspectiva redentiva;
- Dar acessibilidade em nossos templos, construindo rampas, banheiros adaptados e outras ações para incluir os deficientes;
- Trabalhar em setores que estão em idade menor para que não discriminem os deficientes, mostrando o que causou a deficiência naquelas pessoas, fazendo o possível para não constranger a pessoa que serve de exemplo naquela ocasião para os pequenos.
- O desenvolvimento expansivo da doutrina bíblica da queda para que ninguém subestime o alcance destruidor do pecado e as diferentes mazelas que ele nos trouxe.

Olhando adiante
Busquemos falar desse assunto sem com isso pensarmos que estamos nos encaminhando para bandeiras ligadas a uma agenda esquerdista. Até parece que apenas esses setores se preocupam com os excluídos sociais e que setores conservadores são geralmente agentes opressores de nossa sociedade. Devemos ter em vista que trabalharmos com setores que auxiliam os deficientes não nos fazem esquerdistas, mas preocupados em glorificar a Deus, assim como o Senhor Jesus Cristo se importou. Fazermos a missão da igreja também nos faz levar em consideração viabilizarmos uma conduta de acolhimento de pessoas com deficiências físicas. Que possamos ver em nosso país o crescimento de igrejas que possam desempenhar, de forma satisfatória, tão urgente tarefa.