Thomas Watson, 1699, The Christian Soldier or Heaven to taken by
Storm – O Soldado Cristão ou o céu tomado à força.
INTRODUÇÃO
João Batista ao
ouvir na prisão sobre a fama de Cristo envia dois de seus discípulos com a
seguinte pergunta: “És tu aquele que deve vir ou devemos esperar outro?” (verso
3). Não que João Batista não sabia que Jesus Cristo era o verdadeiro Messias,
pois isso tinha sido confirmado pelo Espírito de Deus e por um sinal vindo do
céu (Jo 1.33). Mas João Batista vinha se esforçando para corrigir a ignorância
de seus discípulos que tinham mais respeito por ele do que por Cristo.
No quarto verso,
Cristo responde sua pergunta “Ide e anunciai a João o que estais ouvindo e
vendo: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem,
os mortos são ressuscitados e as boas novas são anunciadas aos pobres”. Jesus
Cristo demonstra que Ele próprio é o verdadeiro Messias. Seus milagres eram
provas visíveis de Sua divindade. Os discípulos de João ouviram, da parte de
Cristo, um grande elogio a respeito de João Batista (verso 7), “O que vocês
foram ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? É como se Cristo tivesse
dito “João Batista não eram um homem inconstante, com pensamentos dúbios, como
uma cana sacudida de uma opinião para outra, ele não era Rúben, instável como a
água, mas era fixo e firme na piedade, nem mesmo a prisão pôde alterar o
caráter dele”.
No verso 8, Ele
diz: “Não, o que vocês foram ver? Um homem vestido de roupas finas?” João não
usava roupas de seda, mas de pele de camelo, ele não desejava viver na corte,
mas no deserto.
Novamente Cristo
elogia João como sendo ele o precursor que preparará o caminho diante dEle
(verso 10). Ele era a estrela da manhã que precedeu o Sol da justiça e Cristo
honra este homem santo. João não é apenas um paralelo para o ministério de
Cristo, mas o chefe dos profetas. O verso 9 diz “Então, o que vocês foram ver,
um profeta? Sim, eu vos digo que mais do que um profeta. Eu vos digo a verdade:
entre os nascidos de mulher não surgiu ninguém maior do que João Batista”. Ele
era eminente, tanto para a dignidade do cargo, como pela clareza do ensino. E
assim, nosso texto proclama: “Desde os dias de João Batista até agora, o reino
dos céus é tomado à força e os servos o tomam dessa maneira”.
1. O prefácio ou
a introdução: “Desde os dias de João Batista até agora”. João Batista era um
pastor zeloso, um Boanerges, ou filho do trovão, que por meio de sua pregação
muitos começaram a ser despertados dos seus pecados.
Sendo assim,
aprender que tipo de ministério é esse que em toda sua excelência, trabalha na
consciência humana como nenhum outro. João levantou sua voz como trombeta
pregando a doutrina do arrependimento debaixo do poder de Deus:
“Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo!” (Mt 3.2). Isso cortava
os pecados dos homens e imediatamente seguia-se da pregação sobre Cristo.
Primeiro João falou sobre o vinagre da Lei, para só então falar do vinho do
Evangelho. Essa foi a pregação que fez os homens buscarem o céu. João não
pregou para receber louvor humano, ele preferiu revelar os pecados destes, sem
buscar o reconhecimento deles como sábio. Esse tipo de pregação deve ser
preferida, pois revela a malignidade humana e expões esta em seus corações.
João era uma luz ardente e brilhante que se consumiu com sua mensagem, fazendo
esta brilhar em sua própria vida, levando muitos com ele para o céu.
Pedro que estava
cheio de um espírito de zelo, humilhou seus ouvintes demonstrando os pecados
deles, abrindo em seguida, uma fonte no sangue de Cristo, justamente em seus
próprios corações compungidos (At. 2.37). É, sem dúvida uma grande compaixão,
receber um ministério que chama o pecador. Se alguém tivesse uma ferida mortal,
esse mesmo desejaria ter sua alma aliviada, se encontrasse a cura para isso,
ele prontamente diria que teve sua dor aliviada.
2. A matéria do
texto. “O Reino de deus é tomado à força e os servos se apoderam dele pela
força.”
Em Mateus 5.5
ouvimos que a “terra é a herança dos mansos”. Como então, tomamos esta pela
força? Temos uma vida militar. Cristo é o nosso capitão, o Evangelho nosso
estandarte e a graça nossa artilharia espiritual, então o céu é tomado à força.
Estas palavras se dividem em duas partes:
a) O Combate –
Com violência.
b) A conquista –
Os servos a tomam pela força.
Trata-se então,
de homens que devem ser mestres em buscar o Reino, mesmo que seja a força.
Doutrina: A
maneira correta de tomar o céu pela força. Os que entram no céu são guerreiros
queridos por Deus.
Essa força tem
um aspecto duplo. Trata-se de guerreiros que devem ser corajosos.
1. Punição dos
pecados. Quando o Urim e Tumim de Arão não fazem efeito, deve-se recorrer à vara
de Moisés. Os ímpios são a parte contaminada e o cancro da comunidade, que por
conta dos magistrados, devem ser removidos para fora. Deus colocou os
magistrados “para terror dos malfeitores” (1 Pd 2.14). Eles devem ser como o
peixe espada, que tem uma espada na cabeça e que não tem sentimentos. Eles
devem ter uma espada na mão, com coragem suficiente para cortar a impiedade. A
leniência de um magistrado é algo terrível e por não punir os transgressores
ele incentiva seus pecados, tornando os pecados de outrem os seus próprios.
Magistratura sem zelo é como o corpo sem espírito. Clemência demais encoraja o
pecado. Não devemos raspar a cabeça daquele que merece o corte.
2. A defesa dos
inocentes. O magistrado deve ser o altar de asilo ou refúgio para os oprimidos
que desejam fugir da opressão. Charles, duque da Calabria, era tão apaixonado
pela justiça que mandou fazer um sino para ser pendurado no portão do seu
palácio, de modo que, quem quisesse tocá-lo seria imediatamente admitido na
presença do duque ou na presença de algum de seus oficiais para ter sua causa
julgada. Aristides era conhecido por sua justiça. Um certo historiador
testemunhou que ele nunca seria a favor de qualquer demanda por causa da
amizade, nem tão pouco seria injusto com seu próprio inimigo. A justiça do
magistrado é o escudo do homem oprimido.
A violência deve
preocupar os cristãos. Embora o céu nos seja dado livremente devemos também
lutar por ele. “O que encontra a sua mão para fazer, faça-o conforme as suas
forças” (Ec. 9.10). Nossa obra é grande, nosso tempo é curto e nosso Mestre
deseja urgência. Precisamos convocar, portanto, todas as faculdades de nossa
alma e nos esforçar como se estivemos lutando em uma guerra que custasse nossa
vida ou morte, para que, enfim, cheguemos ao Reino celeste. Não só devemos ser
diligentes, mas fazermos uso da bravura nesse empenho. Para ilustrar essa
preposição, gostaria de demonstra-la aqui.
1. Qual é o tipo
de violência que se exclui nesse texto.
1.1.
Uma
violência sem conhecimento. Guerrear sem sabedoria. Atos 17.23 “quando passei
perto e vendo os vossos santuários, achei também um que estava perto, com esta
inscrição, para o deus desconhecido”. Estes atenienses eram guerreiros em suas
devoções, mas pode-se dizer a eles as mesmas palavras que Cristo disse a mulher
de Samaria (Jo 4.22) “Vós adorais o que não conheceis”. Assim, os católicos
também são guerreiros em sua religião. Testemunham penitências, jejuns e dilaceram-se
até que lhes escorram o sangue, contudo é um zelo sem conhecimento. A coragem
deles é melhor do que a visão que eles têm. Quando Arão foi queimar o incenso
sob o altar, ele foi o primeiro a acender as lâmpadas (Ex 25.7). Quando o zelo
queima com o incenso o primeiro lugar a ser acendido deve ser o do
conhecimento.
1.2.
Ele
exclui a violência sangrenta que é dupla. Em primeiro lugar, quando se usa mãos
violentas sobre si mesmo. O corpo é uma prisão terrena, onde Deus colocou a
alma. Não devemos por fim a essa prisão, mas permanecer com ela até que Deus
nos livre pela morte. Somos sentinelas que não tem permissão para abrir a cela
sem autorização do nosso capitão. Não devemos ousar fazer isto sem a permissão
de Deus. Nossos corpos são templo do Espírito Santo (1Co. 6.9); quando se faz
dano ao corpo, destrói-se o templo de Deus. A lâmpada da vida deve permanecer
acessa, pois naturalmente existe combustível para mantê-la assim.
Em segundo lugar, quando se tira a vida
de outro. Há muitas evidências dessa violência em nossos dias. Nenhum pecado
clama como esse que é feito a custa do sangue de outrem (Gn. 4.10). Se existe
uma maldição para aquele que fere em oculto como explica Deuteronômio 27.14,
então o assassino é duplamente amaldiçoado por causa do homicídio. Se alguém
matasse outro sem intenção era possível adorar, desde que levasse sua oferta ao
altar, mas se ele tivesse feito isso por vontade própria, ninguém poderia
protegê-lo, nem mesmo o santuário de Deus (Ex. 21.14) “se um homem planeja e
mata outro homem deliberadamente, levará o homicida e será morto longe do meu
altar”. Joabe, sendo homem de sangue, buscou fugir da ira do rei Salamão,
embora tenha se apegado às pontas do altar (1Re. 8.29). Antigamente na Boêmia
um assassino devia ser decapitado e sua cabeça colocada no mesmo caixão daquele
que ele havia matado. Aqui vemos a exclusão dessa violência.
2. Qual é a força utilizada em nosso texto? Uma
força santa. Esse sentido é duplo.
Temos que
empreender força para defender a verdade. É necessário citar a pergunta de
Pilatos “que é a verdade?” A verdade é tanto a bendita Palavra de Deus, que é
chamada a “Palavra da verdade”, como as doutrinas que são deduzidas a partir da
Palavra. Demonstro com isso as seguintes doutrinas: A doutrina da Trindade, a
da criação, a graça, a justificação pelo sangue de Cristo, a regeneração, a
ressurreição dos mortos e a vida de glória. Estas verdades precisam ser
defendidas com zelo e força por nós, mesmo que isso custe a nossa própria vida.
A verdade é o
que existe de mais glorioso. Não se deve esconder esse ouro precioso que é a
verdade. O que devemos fazer para proteger essa riqueza? Ela é antiga, seus
cabelos são brancos e evocam respeito, pois se trata daquele que é Ancião de
dias. A verdade é infalível, ela é a estrela que conduz a Cristo. A verdade é
pura (Sl 119.140). Ela é comparada a prata refinada sete vezes (Sl. 12.6). Não
existem manchas, por menores que sejam no rosto da verdade. A única coisa que
ela respira é a santidade. A verdade triunfa. Ela é como um grande
conquistador, ela abate os seus adversários, depois de conquistar o país e exibe
seus troféus de vitória. A verdade pode ser combatida, mas nunca vencida. No
tempo de Diocleciano os dias pareciam desesperadores, a verdade parecia
sucumbida, pouco tempo depois veio à época de Constatino e então a verdade
novamente ergueu a cabeça. Quando as águas do Tâmisa pareciam que iam secar as
fortes águas vindas de Deus estavam do lado da verdade. Conquanto houvesse medo
que ela não prevalecesse, os céus foram dissolvidos (2Pe 3.12) e a verdade que
vem de Deus permaneceu (1Pe 1.25).
A verdade tem
efeitos nobres. A verdade faz germinar o novo nascimento. Deus não nos regenera
por milagres ou revelações, mas pela Palavra da verdade (Tg 1.18). A verdade é
criadora da graça, por isso ela a alimenta (1Tm 4.6). A verdade santifica (Jo
17.17) “santifica-os na verdade”. A verdade é o selo que imprime a santidade em
nós, ela é tanto um espelho para nos mostrar os nossos defeitos, como uma pia
para lavá-los. A verdade nos torna livre (Jo 18.32), ela lança fora os grilhões
do pecado e nos coloca em um estado de filiação e realeza (Rm. 8.11). A verdade
é reconfortante, ela anima mais do que o vinho. Quando a harpa de Davi não
podia dar nenhum conforto, a verdade se encarregou disso (Sl 119.50) “Esta é a
minha consolação na minha aflição porque a tua Palavra me consola”. A verdade é
um remédio contra o erro. O erro é o adultério da mente que mancha a alma com
traição e sangue. O erro é como um dique de vícios. Um homem pode muito bem
morrer por envenenamento, assim como por um tiro, mas estando no erro como estará
perante a verdade? A razão pela qual, muitos têm sido levados ao erro é porque
ou não conheciam ou não amavam a verdade. Eu nunca teria palavras suficientes
para louvar a verdade. A verdade é o fundamento de nossa fé que fornece um
modelo exato de piedade, que nos mostra em que devemos acreditar. Se nos tirar
a verdade a nossa fé é um conto de fadas. A verdade é a flor mais bela e a
coroa da igreja. Nós não temos joias mais ricas e preciosas do que a nossa
alma, porém Deus confia a nós Sua joia mais preciosa que é a Sua verdade. A
verdade é o símbolo de que nos distingue da falsa igreja, como a castidade
distingue a mulher virtuosa de uma prostituta. Em suma, a verdade é o baluarte
de uma nação. Em 2 Crônicas 11.17 diz “os levitas que eram anunciadores da verdade
fortaleceram o reino”. A verdade pode ser comparada com o capitólio de Roma que
era o lugar de maior segurança ou como a torre de Davi em que “pendiam mil
escudos” (Ct 4.4). Nossas tropas e exércitos não nos protegem como a verdade o
faz. A verdade é a melhor defesa de um reino, se apenas uma parte desse reino
defender o papado, a mecha do cabelo é cortada e onde estará à força desse
país? Porque seríamos guerreiros se não fosse pela verdade? Estamos convocados para
lutar, como se estivéssemos em agonia “pela fé que uma vez foi entregue aos
santos (Jd, verso 3)”. Se a verdade de uma vez for embora da nossa alma,
podemos escrever este epitáfio no túmulo de pedra da Inglaterra: “Sua glória se
foi!”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário