quinta-feira, 23 de junho de 2011

O posicionamento evangélico diante da cultura nordestina nas festas de junho

Estamos em uma das datas mais significativas para o povo nordestino, as festas juninas. É precisamente para esta data que se prepara o sertanejo no que se refere à plantação, especialmente a do milho. Dizemos aqui se o inverno* é bom teremos milho nessa época, justamente porque o milho é o principal ingrediente de muitos pratos típicos de nossa cultura. Essa também é uma época colorida onde se exalta a cultura matuta do sertanejo, tão abandonada, mais especialmente nestes dias com a absorção de uma cultura que não é nossa divulgada a granel pelos potentes recursos midiáticos.

Já disse em outra postagem que deveríamos tomar cuidado com o abandono da cultura. Se isso é uma realidade nos próprios nordestinos o é principalmente entre aqueles denominados evangélicos. Tenho muita cautela aqui ao tratar desse assunto, não que eu ache que os mesmos são delicados, mas porque devo respeitar aqueles que pensam diferente de mim, no princípio encontrado em Romanos 14.1-12. E porque também entendo o ponto de vista daqueles que defendem o abandono da cultura, tão mesclada com superstições e abusos ao longo dos anos. Mas o que dizer do abandono de uma cultura tão rica? O que há de errado com as quadrilhas, os “arraiás”, as comidas típicas e a vestimenta nordestina mostrando o típico homem do campo de nossas terras? Penso que muitas igrejas e líderes são muito mais favoráveis a prática americanizada como o uso do terno e certos clichês do que a nossa própria cultura sertaneja.

É claro que não devemos desconsiderar a imagem destas festas relacionadas ao culto católico romano e aos ícones desse mês de junho como São Pedro, Santo Antônio e São João. Na raiz, as festas juninas têm ampla conotação religiosa, mas entendo que esta conotação, ao longo dos anos tem perdido consideravelmente a força, falo isso em decorrência do abandono da religiosidade que faz os católicos também vítimas do secularismo. Mas entendo isso como uma grande oportunidade. Na época da Reforma era comum os reformados passarem na cultura um pente fino para saberem se poderiam ou não usar certos hábitos culturais. Enquanto alguns grupos fizeram o possível para abolir certas práticas, outros, no entanto, buscavam expurgar a cultura e conferir legitimidade após isso, fazendo da história de um povo a expressão máxima de sua identidade e jogando tudo o que não era bíblico fora, adaptando a cultura ao ponto de vista escriturístico. É possível ir a países de cultura protestante e ver danças típicas, festas e outras manifestações culturais bem mais antigas do que a Reforma Protestante, identificando o povo com suas práticas culturais adquiridas ao longo do tempo.

Lamentavelmente no Brasil a cultura entre muitos evangélicos é na realidade uma sub-cultura, o que faz onerar o culto ao Senhor, enchendo o mesmo de elementos estranhos como danças, coreografias e práticas das mais esdrúxulas e modistas em razão do abandono da cultura nos setores comuns da sociedade, fazendo-nos uma ameaça a rica cultura do nosso país em todas as nossas regiões.

Acho que quanto a esse abandono boa parte da culpa é de responsabilidade dos pastores. Temos muitas vozes no segmento evangélico e boa parte das que tem respeitabilidade não refletem sobre este ponto de vista com seriedade. Deveríamos sinceramente considerar esses desafios para a igreja contemporânea. Sei que a maior dificuldade é unir os pensamentos pelas barreiras eclesiásticas, mas o que dizer de uma reflexão sincera por parte daqueles que influenciam no sentido de aclarar esses temas para o povo da igreja? Povo este que necessita de um ensino que atenda as demandas existentes em nossa realidade. Veja que não estou falando de uma nova teologia, estou falando de uma análise cultural, envolvendo as diversas culturas dos ribeirinhos, dos pampas gaúchos, dos marajoaras maranhenses, dos pantaneiros, dos sertanejos. Quem nos dera sonhar com uma reforma cultural entre os evangélicos, onde pudéssemos contribuir com nossas ricas manifestações culturais, evitando assim o choque cultural sentido quando da proclamação das boas novas, principal objetivo quanto a este particular.

Termino dizendo que não sou contra nossas festas. Sou contra os excessos que existem em razão do abandono de uma mentalidade esclarecida biblicamente. Precisamos fomentar o desenvolvimento completo do ser humano e as manifestações culturais fazem parte do ethos da nossa sociedade. Deus levante um debate sincero sobre esse tema e nos faça avançar neste conhecimento, amém.     

*Inverno é o período das chuvas na região Nordeste e não necessariamente a estação.

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